Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2)

Nesta iniciativa, as tecnologias de acesso à água são construídas para garantir a estocagem de água para a produção de alimentos saudáveis e para a criação de animais. Este estoque chamamos de segunda água.

Objetivo

Estocar nos tempos de fartura para ter nos tempos de escassez. Essa máxima se aplica perfeitamente no Semiárido, onde a água da chuva tem sido guardada para matar a sede das pessoas, dos animais e das plantas. Neste espaço, ter água significa segurança hídrica e também segurança alimentar e nutricional, porque a água da chuva armazenada serve igualmente para produzir alimentos e sementes.

O Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC), criado pela ASA no início dos anos 2000, garante a água para consumo humano, que chamamos de primeira água. Com o intuito de ampliar o estoque de água das famílias, a ASA criou em 2007 o Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2). Nesta iniciativa, as tecnologias de acesso à água são construídas para garantir a estocagem de água para a produção: para o plantio e para a criação de animais. Este estoque chamamos de segunda água. O nome do programa indica a estrutura mínima que as famílias precisam para produzir: a terra; o espaço de morada, plantio e criação animal; e a água, para cultivar e manter a vida das pessoas, das plantas e dos animais.

Juntos o P1MC e o P1+2 compõem o Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido da ASA.

Os objetivos do P1+2 são promover a soberania e a segurança alimentar e nutricional das famílias agricultoras e fomentar a geração de emprego e renda para as mesmas. A estratégia para alcançar esses objetivos é estimular a construção de processos participativos para o desenvolvimento rural do Semiárido brasileiro.

Contexto

Apesar do enorme potencial da natureza e do seu povo, o Semiárido é marcado por grandes desigualdades sociais. Historicamente, o Estado brasileiro investiu na construção de grandes obras hídricas como forma de solucionar o problema da falta de água na região.

Estima-se que o Nordeste abriga mais de 70 mil açudes, que acumulam 37 bilhões de m³ de água. Todo esse volume de água está concentrado em propriedades particulares e não é compartilhado com a população difusa do Semiárido.

A distribuição das terras também é extremamente desigual. Segundo o Censo Agropecuário 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 76,8% do total de estabelecimentos rurais brasileiros são unidades da agricultura familiar, mas ocupam apenas 23% do total de terras destinadas à produção agropecuária. Já as unidades não familiares representam 23,2% dos estabelecimentos rurais e detêm 77% das terras. A concentração também é mostrada comparando-se a área média dos estabelecimentos familiares (20,75 ha) com a dos não familiares (229,94 ha).

Segundo o Anuário Estatístico da Agricultura Familiar 2023, da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG), a agricultura familiar é responsável por 23% do valor bruto da produção agropecuária e por 67% das ocupações no campo brasileiro. É a oitava maior produtora de alimentos do mundo.

Ter acesso a uma alimentação saudável, de qualidade e em quantidade suficiente é um direito de todos e todas. Isso é Segurança Alimentar e Nutricional. Já a Soberania Alimentar define a autonomia dos povos de decidir o que comer e como produzir, respeitando seus hábitos alimentares, cultura e seus territórios. 

Para garantir o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA), existe o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN). É através desse sistema que os órgãos governamentais (municipais, estaduais e federais) e as organizações da sociedade civil, devem atuar em conjunto na formulação e implementação de políticas, planos, programas e ações com vistas a promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população e a realização progressiva do DHAA, o que está definido pela Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN).

É necessário ter como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam sustentáveis do ponto de vista social, econômico e ambiental. 

As violações do DHAA ainda existentes no país decorrem, essencialmente, da falta de acesso à terra para produção de alimentos ou à falta de emprego, ou renda.

Nesse contexto, a ASA defende a produção agrícola de base agroecológica, que traz entre suas premissas o cultivo livre de agrotóxicos, o uso de sementes crioulas, o manejo do solo vivo e a integração das florestas com os povos. A ASA defende também o acesso à água e à terra como condição fundamental para que as famílias do Semiárido brasileiro produzam alimentos que fazem parte de sua cultura alimentar.

Metodologia

O P1+2 baseia-se nos seguintes princípios e estratégias metodológicas:

  • Valorização das agricultoras e dos agricultores e de suas organizações como inovadoras técnicas e sociais e, portanto, detentoras de conhecimentos e experiências;
  • Fortalecimento dos processos educativos, sócio-organizativos e políticos locais, contribuindo para a autonomia e o protagonismo dos agricultores e agricultoras e suas organizações na construção do desenvolvimento sustentável;
  • Favorecimento das interações entre agricultores e agricultoras de comunidades, municípios, estados e regiões distintas do Semiárido;
  • Promoção de processos formativos baseados na Educação Popular, na qual os conhecimentos prático e teórico se retroalimentam. Esta metodologia favorece o estabelecimento de uma dinâmica horizontal entre agricultores/as e suas organizações. Nela, agricultores/as-experimentadores se tornam também agricultores/as-promotores/as, encarregando-se de apoiar as atividades de formação técnica e estímulo à experimentação na microrregião, nos municípios e comunidades;
  • Adoção da Agroecologia como base técnica-metodológica e científica para a construção do novo modelo de desenvolvimento rural e do fortalecimento de ações de convivência com o Semiárido.

Atividades

No início do programa, as lideranças dos municípios são convidadas a atuar no processo de identificação das famílias e das comunidades que participarão do P1+2. As chamadas comissões municipais e comunitárias participam efetivamente do cadastramento e seleção das famílias a partir dos critérios estabelecidos. Estas comissões ajudam a identificar futuros(as) beneficiários(as), pensando nas suas necessidades hídricas e nas características do terreno onde as tecnologias serão construídas.

Para ser contemplada, a família precisa atender a alguns critérios: ter renda per capita familiar de até meio salário mínimo; estar inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico); ter Número de Identificação Social (NIS) e possuir cisternas de água para consumo humano.Dentre as famílias que atendem aos critérios, há aquelas que são prioridade no programa. São as famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, chefiadas por mulheres, com crianças de 0 a 6 anos, crianças frequentando a escola, pessoas com 65 anos ou mais, com deficiência física e/ou mental, e povos indígenas e comunidades tradicionais.

Somam-se ainda outros requisitos técnicos importantes para garantir o sucesso na implementação do programa, tais como a característica dos solos, as formações rochosas e também as dimensões e possíveis locais de implementação das tecnologias.

Capacitação das Comissões Municipais em Critério de Seleção das Famílias

A primeira capacitação realizada pelo P1+2 é a das Comissões Municipais. O objetivo é fortalecer a governança local para a gestão do programa. A capacitação inclui: apresentação do projeto, dos critérios de seleção das famílias beneficiárias, e seleção das comunidades prioritárias. 

A ação visa melhorar o acompanhamento do projeto, fortalecer o controle social, e promover a transparência na gestão pública. Ela é realizada por meio de duas reuniões com as comissões dos municípios selecionados.

Capacitações das famílias beneficiárias

As famílias que fazem parte do P1+2 passam por duas formações: em Gestão da Água para Produção de Alimentos (GAPA) e em Sistema Simplificado de Manejo da Água (SISMA). O propósito desses cursos é dialogar sobre elementos que compõem o projeto político da convivência com o Semiárido e da Agroecologia e apoiar as famílias no uso da água e das tecnologias sociais.

  • Gestão da Água para Produção de Alimentos (GAPA): Durante os cursos de GAPA, as famílias trocam conhecimentos sobre o manejo da água no arredor de casa, os cuidados com a horta, as plantas medicinais, o uso dos defensivos naturais, a fertilização do solo, trabalham temas como gênero e a participação das juventudes, constroem instrumentos coletivos comunitários, entre outros assuntos.
  • Sistema Simplificado de Manejo da Água (SISMA): Essa capacitação ocorre após a implementação da tecnologia social. Durante a formação, as famílias montam um sistema simplificado de aguamento que funcione com economia de água, baseado nos princípios da Agroecologia e da Convivência com o Semiárido. O SISMA é realizado na propriedade de uma família já beneficiada pelo programa, para que os participantes aprendam com as estratégias utilizadas pelos anfitriões.

Capacitação de Pedreiros e Pedreiras

A capacitação acontece para garantir a qualidade das tecnologias sociais implantadas no P1+2 e também para fortalecer o processo de mobilização e de envolvimento da comunidade, fazendo circular a economia local. Para além da técnica para a construção, os participantes também aprendem a identificar o melhor local para a edificação da tecnologia, assim como a fazer a conservação, manejo, reparos e outros aspectos.

Nas capacitações também são discutidos conteúdos teóricos relacionados com a proposta da convivência com o Semiárido. Um dos objetivos é inserir pedreiros e pedreiras na lógica do Programa e torná-los atores e sujeitos dos processos, dado o contato direto que eles têm com as famílias e comunidades.

Esse componente, além de vislumbrar o fortalecimento da produção das famílias, para segurança e soberania alimentar e geração de renda, também incorpora a compreensão de que os agroecossistemas podem ser vistos de forma sistêmica e integrada à história e à soberania das pessoas que ali vivem.

Para dar conta destes objetivos, utilizam-se dois instrumentais metodológicos. O primeiro deles é o Diagnóstico de Agroecossistemas. O diagnóstico é um instrumento participativo que tem por objetivo aprofundar a leitura sobre o agroecossistema, qualificando o diálogo com as famílias. Esse diálogo busca construir de forma compartilhada uma reflexão sobre as limitações e potencialidades de cada agroecossistema. São pensadas as oportunidades que se abrem com a implementação da segunda água e se busca produzir subsídios para a elaboração do Projeto Produtivo.

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O segundo instrumento é o Projeto Produtivo. Este, como diz o nome, envolve a elaboração de um projeto, cujo objetivo é de potencializar a produção agroecológica das famílias. Os projetos levam em consideração os sonhos das famílias para seus agroecossistemas, bem como sua trajetória, sua força de trabalho, seu espaço de produção. Valorizam a autonomia das mulheres e das famílias, assim como seu poder de decisão.

Na metodologia aplicada, relaciona-se a realização do GAPA ao Diagnóstico do Agroecossistema e o SISMA à elaboração do Projeto Produtivo. Após a implementação, as famílias atualizam os diagnósticos já considerando a chegada da segunda água, bem como insumos e infraestruturas. Toda essa dinâmica é acompanhada pela assessoria técnica das organizações executoras.

Intercâmbios: inovação e comunicação

Os intercâmbios estão na base da metodologia das ações da ASA e do P1+2. Se constituem em espaços privilegiados de aprendizado coletivo e promovem a troca horizontal de experiências e conhecimentos entre agricultores/as, estimulando a criatividade na solução de seus problemas cotidianos.

Os intercâmbios acontecem por meio de visitas de um grupo de agricultores/as a uma família, associação ou cooperativa para conhecer experiências inovadoras. Eles ocorrem de acordo com o interesse dos/das agricultores/as em formação e pressupõem a capacidade destes sujeitos adaptarem o conhecimento às suas realidades. 

Sistematização de experiências

Partindo do pressuposto de que os/as agricultores/as são detentores de conhecimento, que eles/elas possuem capacidade de adaptar este conhecimento a distintas realidades e que são potencialmente comunicadores/as, criou-se dois instrumentos pedagógicos para apoiar os intercâmbios: os boletins e banners. 

Estes produtos de comunicação, centrados na história de vida dos/as agricultores/as e/ou em suas experiências coletivas, são a materialização de um processo de construção coletiva do conhecimento e potencializam a circulação de iniciativas bem sucedidas no campo da agricultura familiar no Semiárido. Outro efeito importante das sistematizações é a elevação da autoestima das famílias, que ao terem suas histórias registradas e reconhecidas se sentem valorizadas.

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