Por Verônica Pragana, Asacom
Quando um em cada dez brasileiros passa pelo sexto ano consecutivo de seca e o discurso de “combate à seca” ganha força em detrimento da proposta de convivência com o Semiárido, a Articulação Semiárido (ASA) planeja, hoje e amanhã (2 e 3), em Camaragibe, Região Metropolitana do Recife, a execução dos programas Um Milhão de Cisternas (P1MC) e Uma Terra e Duas Águas (P1+2) através de convênios com a Fundação Banco do Brasil (FBB) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Hoje, aliás, o P1+2 completa 10 anos de atuação.
As ações dos programas possibilitarão às famílias agricultoras do Semiárido acessar água para beber, cozinhar, plantar e criar animais e representam oportunidades de trabalho temporário para que tem o ofício de cisterneiros e cisterneiras (pedreiros de cisternas). Na região, vivem mais da metade dos brasileiros e brasileiras em situação de miséria no país e cerca de 350 mil famílias ainda carecem de água potável para beber.
Com essas ações, 3.198 famílias de 17 municípios dos estados de Minas Gerais, Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí passarão a ter cisternas de 16 mil litros que armazenam água da chuva para consumo humano ao lado de casa. Outras 390 famílias da Bahia, Sergipe e Pernambuco terão tecnologias sociais para guardar água para a produção de alimentos durante todo o ano.
“Nenhum dinheiro do mundo paga a satisfação de ver o semblante das pessoas quando dissemos que vamos dar continuidade às ações em algumas comunidades. Estas famílias estavam ameaçadas de ir embora da região pela falta de trabalho e água. Na minha região, há municípios que não sabem nem quem será o prefeito. Imagina o que significa para as comunidades passar por uma situação de seca como esta sem ter nenhum gestor público à frente”, testemunha Francisco Braz, representante da ONG Elo Amigo, que vai executar o P1MC nas regiões Centro-Sul e Sertão Central do Ceará.
Enquanto membro da coordenação executiva da ASA, Naidison Baptista, que compôs a mesa de abertura com representantes da FBB, assegurou que a Fundação ao firmar mais dois contratos com a ASA está “na estrada da resistência, de não deixar que a experiência de convivência com o Semiárido, construída por todos nós, desapareça do mapa, morra”. Em 2016, o Governo Federal – que nas gestões de Lula e Dilma Rousseff reforçou a proposta de convivência - não firmou nenhum novo termo de parceria com a ASA para a continuidade do P1MC e P1+2.
No início da fala, Naidison resgatou outro momento importante em que a parceria da Fundação reforçou o caminho da convivência. “A FBB não aceitou trabalhar com a cisterna de polietileno [defendida pelo governo Dilma no início da sua primeira gestão] por ser incoerente com o processo de incentivo às tecnologias sociais que vocês vinham desenvolvendo. E essa postura foi estratégica para outros desdobramentos importantes para o P1MC. A Lei de Cisternas nasceu daí, assim como os contratos [novo instrumento jurídico para mediar a relação entre organizações da sociedade civil e o governo federal] e o adiantamento de recursos para executarmos esses contratos”, conta Naidison.
Natural do interior de São Paulo, mas com passagens em Teresina, no Piauí, e Salvador e Feira de Santana, na Bahia, o diretor de desenvolvimento social da FBB, Rogério Buriel, revelou na sua fala um compromisso pessoal com ações que promovem dignidade para as famílias do Semiárido. Para os representantes das organizações da ASA que executarão os programas, ele revelou o que foi levado em conta para a FBB direcionar os recursos para estes dois novos contratos com a ASA. “O fazer bem feito aquilo que foi confiado a vocês, que Naidison se referiu há pouco, trouxe uma credibilidade para a ASA que tornou possível aplicar esses recursos para as ações de convivência. O alto impacto social, a execução séria e correta e a visibilidade da ação ajudaram nesta decisão.”
Por fim, Naidison deixou um recado para os participantes: “O direito das famílias do Semiárido está ameaçado. Nós temos que resistir. Não devemos, nem podemos politicamente nos entregar. Em vez de esmola, oferecemos condições da família viver, restauramos a autonomia, tiramos da fila de pedintes. O Semiárido precisa e deve ser tratado de forma diferente. E nosso jeito de resistir é fazendo com alegria, compromisso e emoção para construir um Semiárido que nós acreditamos".
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