Sara Brito | ASACom
“A gente vive um momento ímpar. O Programa Cisternas está iniciando um novo termo com a ASA para a implementação de mais 50 mil cisternas no Semiárido. E estamos entregando 75 mil cisternas prontas do termo anterior. Mas não estamos celebrando a construção de cisternas, estamos celebrando a convivência com o Semiárido.”
As palavras de Naidison Baptista, da coordenação executiva da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), deram o tom da Oficina de Planejamento dos Programas Um Milhão de Cisternas, Uma Terra e Duas Águas e Cisterna nas Escolas, realizado entre os dias 18 e 22 de agosto, em Pernambuco. Com o lema “Democracia forte, Brasil alimentado – o Semiárido na defesa do Bem Viver, agroecologia e direitos”, o encontro reuniu cerca de 300 pessoas representando 94 organizações da sociedade civil.
Para esta nova fase de execução dos programas, a ASA irá trazer inovações que focam especialmente na participação e promoção dos direitos das mulheres. O acúmulo do projeto Quintais das Margaridas, executado por 14 organizações sociais da ASA, trouxe contribuições de práticas que serão assumidas pelo P1MC e P1+2, como a apropriação da Campanha pela Divisão Justa do Trabalho Doméstico, e a incorporação das cirandas, espaços para as crianças que permitem a participação das mães e cuidadoras nas formações. No P1+2, outra inovação é a adoção das Cadernetas Agroecológicas no trabalho com as mulheres atendidas pelo programa.
“Nesse momento, a gente conseguiu articular uma abordagem política e metodológica voltada para as mulheres camponesas. A ASA construiu uma estratégia de aprofundar o olhar para as mulheres, sobre o papel das mulheres e na luta pela equidade entre homens e mulheres. Eu acho que isso é muito revolucionário. Porque a gente sabe muito bem que se a gente não trouxer, não aprofundar, não refletir a questão do patriarcado, e buscando a construção do feminismo, a gente não tem convivência com o Semiárido”, destacou Glória Araújo, da coordenação executiva da ASA.
Glória destaca ainda as cirandas como possibilidades de formações contextualizadas com as crianças, além de garantir a participação das mulheres nas atividades. “A criança passa a fazer uma leitura desse lugar, com a capacidade que esse lugar tem, a beleza do Semiárido, as riquezas do seu povo e a sua natureza. Então começar a fazer isso com as crianças de uma forma leve, lúdica e educativa. É fantástico e as mulheres ficam tranquilas participando dos eventos de formação”, completa.
Cisternas e o acesso a direitos
As mais de 50 mil cisternas que serão construídas pela ASA nos próximos 18 meses fazem parte do Programa Cisternas, uma política pública do Governo Federal, gerenciada pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS). Serão 46 mil cisternas de 16 mil litros para o consumo humano (primeira água), quatro mil cisternas de 52 mil litros para a produção de alimentos e criação de animais (segunda água), além de 245 cisternas escolares em todo o Semiárido brasileiro.
O Programa Cisternas faz parte de um conjunto de políticas públicas de combate à fome e convivência com o Semiárido que são possíveis a partir da prioridade do investimento público e do interesse dos gestores. Não à toa, o Brasil saiu novamente do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2025, para o qual havia retornado em 2022, após o governo Bolsonaro extinguir o Bolsa Família e outros programas sociais, e zerar os investimentos no Programa Cisternas.
“Essas políticas não estão dadas, elas podem sumir a qualquer momento, não são políticas de Estado. Elas estão ameaçadas por uma eleição. Eleger deputados e senadores como os que temos agora é um obstáculo para a convivência com o Semiárido”, afirmou Naidison Baptista durante a Oficina de planejamento.
Para a ASA, as cisternas não são um fim em si mesmas, mas um instrumento para a convivência com o Semiárido, pois a implementação da tecnologia social de acesso à água deve vir acompanhada do debate do acesso a direitos das famílias e comunidades do Semiárido. Por isso, os programas desenvolvidos pela ASA incluem ações de formação, mobilização, incidência política e participação social das famílias atendidas.
“Esse trabalho é na perspectiva da dignidade humana, do cuidado, da política pública atendendo os povos do Semiárido. E a ASA tem um papel importante no diálogo com essas famílias, refletindo com elas a questão da água como direito, da terra como direito, da produção, da alimentação. Então é um planejamento que não é pra ficar no papel”, pontua Glória Araújo, da coordenação executiva da ASA.

Durante a oficina de planejamento “Democracia forte, Brasil alimentado”, os participantes puderam debater sobre as ações dos Programas, diretrizes técnicas, cronogramas e metas, além de construir coletivamente acordos e encaminhamentos para que as implementações sejam realizadas com qualidade e transparência.
Leilane Melo, da Cáritas Diocesana de Itapipoca, foi uma das participantes do encontro. A instituição irá implementar cisternas do P1MC e do Cisternas nas Escolas em três municípios do estado do Ceará. “A gente vem pra cá e sai esperançoso, com muitas ideias, muitas trocas, de ouvir experiências e poder partilhar com as outras instituições. Volto para a minha instituição cheia de ideias, cheia de provocações e cheia de vontade de melhorar ainda mais, para que esse programa seja mais forte e que a gente consiga levar esse entusiasmo também para as famílias que vão ser atendidas”, afirmou ela.
Na programação do encontro, também foi realizada a Oficina de Avaliação do contrato que implementou 1.400 tecnologias sociais de armazenamento de água para produção com apoio da Fundação Banco do Brasil e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).