Kleber Nunes | ASACom
Ato público pede ‘revolução agroecológica’ para combater a fome e os efeitos da emergência climática
Evento protagonizado por agricultoras e agricultores marcou o Dia Mundial da Alimentação, em Juazeiro (BA)

Às margens do Opará – como os povos originários chamam o Rio São Francisco – em Juazeiro (BA), participantes do 13º Congresso Brasileiro de Agroecologia (CBA) realizaram, nesta quinta-feira (16), um ato público em defesa de uma “revolução agroecológica”. Com músicas, bandeiras, faixas e palavras de ordem, agricultoras e agricultores protagonizaram o evento que marcou, com denúncias e anúncios, o Dia Mundial da Alimentação.
No palco montado na orla, lideranças do campo se revezaram nas falas políticas para reafirmar a agroecologia e a convivência com o Semiárido como caminhos para a produção de alimentos saudáveis frente às mudanças climáticas. A mensagem foi direcionada ao estado brasileiro representado no ato pelos ministros Márcio Macedo (Secretaria Geral da Presidência), Paulo Teixeira (Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar) e Wellington Dias (Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome).
“Nós mudamos o Semiárido do Brasil porque aprendemos que não é lutando contra a seca que a gente vai diminuir as desigualdades sociais que marcaram a nossa história, mas é convivendo com ela e trazendo para os territórios as experiências de agroecologia”, defendeu a agricultora e coordenadora executiva da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), Roselita Vitor, que falou no ato em nome das redes de organizações da sociedade civil.
Reforçando o Dia Mundial da Alimentação como uma data de reflexão sobre o futuro, Roselita chamou a atenção dos gestores públicos municipais, estaduais e do executivo federal para as ameaças à produção de alimentos. Não apenas no Semiárido, mas em todos os territórios agroecológicos do país há, segundo a agricultora, um avanço de um modelo centralizador que explora as riquezas naturais e condena os povos à insegurança alimentar.
“É importante a gente trazer aqui que os nossos territórios estão vivendo fortes ataques da mineração e do atual modelo de produção de energia renovável que têm forçado as famílias a saírem das suas comunidades. Além disso, o Brasil continua sendo o país que mais usa agrotóxicos na produção de alimentos e as sementes transgênicas ameaçam a agrobiodiversidade dos nossos territórios. Isso não traz soberania e segurança alimentar. A nossa luta é para que a agroecologia seja a política de produção de alimentos para todas as pessoas”, afirmou Roselita.

Revolução agroecológica
O representante dos povos indígenas no ato, Jairã Silva, do povo Tingui Botó, de Alagoas, destacou que para o Brasil avançar no combate à fome é preciso priorizar três políticas públicas: reforma agrária, demarcação de terras indígenas e quilombolas, e reforma urbana.
“Ministros levem esse recado ao presidente Lula: não há ‘uma nova revolução verde’, o que a gente precisa é de uma revolução agroecológica para acabar com a fome, o desmatamento e enfrentar as mudanças climáticas”, declarou Jairã sob gritos e aplausos do público.
A presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Elisabetta Recine, lembrou a conquista recente do Brasil que em tempo recorde retirou 33 milhões da extrema pobreza e saiu do Mapa da Fome. Segundo ela, “fomos nós que conseguimos esse feito em apenas dois anos e que devemos cobrar mais orçamento público” para a agroecologia.
“Como disse o Naidison na abertura do CBA que não existe nada do que nós temos que não tenha sido conquistado na luta, ou seja, nada aqui está garantido, a luta é permanente. Não uma luta raivosa, mas uma luta revolucionária pela criatividade, revolucionária pela solidariedade”, disse.
Anúncios
O ato público também foi palco para anúncios de novos investimentos públicos em projetos que priorizam a agroecologia e fortalecem as ações de convivência com os territórios. Entre as novidades, o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira, realizou a assinatura dos 37 projetos aprovados no edital do Programa Ecoforte e de contratos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar.
Teixeira oficializou, ainda, uma nova parceria entre o MDA e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) para financiamento de rede de pesquisadores em agroecologia, para monitoramento do Planapo.
O ministro do MDA também falou do Acordo de Cooperação Técnica entre o ministério e o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) para supostamente ampliar ações de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater). Mulheres e jovens camponeses se manifestaram contra a medida ficando de costas para o palco. O Senar é ligado ao agronegócio e, portanto, está ao lado de quem age contra a agroecologia.
O ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), Wellington Dias, fez o lançamento do Marco de Sistemas Alimentares e Clima para as Políticas Públicas, assinou novos contratos do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e anunciou a abertura de um novo edital do Programa Cisternas para a construção de mais 97 mil tecnologias de captação de água com um investimento de R$ 650 milhões.
13º CBA
Nesta 13ª edição, em Juazeiro (BA), o CBA é realizado pela Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), com organização local da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), do Serviço de Assessoria a Organizações Populares (Sasop), da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), da Universidade do Estado da Bahia (Uneb de Juazeiro), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do Movimento dos Pequenos e Pequenas Agricultoras (MPA), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE) e Rede de Agroecologia Povos da Mata .
O Congresso conta patrocínio da Fundação Banco do Brasil e do BNDES e apoio do Governo Federal por meio dos Ministérios da Saúde, Igualdade Racial, Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, e Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e FioTec, e Prefeitura Municipal de Juazeiro; e Governo do Estado da Bahia, por meio do Programa Bahia sem Fome e Bahia Turismo.
Conta também com a contribuição de representantes de diversas organizações, redes e articulações da sociedade civil, instituições de ensino, movimentos sociais populares e comunidades tradicionais.