Miguel Cela | ASACom
“É nos territórios que a vida pulsa”: Encontro de Agricultoras e Agricultores Experimentadores no 13º CBA destaca saberes camponeses e justiça climática
No 13º CBA, agricultores e agricultoras destacam saberes camponeses, convivência com o Semiárido e justiça climática no Semiárido baiano.

Este ano, o Encontro de Agricultoras e Agricultores Experimentadores chega à sétima edição e acontece pela primeira vez dentro do 13º Congresso Brasileiro de Agroecologia (13º CBA). A programação começou nesta quarta-feira (15) e vai até o próximo dia 18 de outubro (sábado).
A abertura foi conduzida por agricultoras e agricultores que representam a força dos saberes e práticas camponesas, reafirmando que “é nos territórios que a vida pulsa”. Com presença de Maria Silvani Santos, agricultora de fundo e fecho de pasto; Roselita Vitor, liderança da Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia e a coordenadora da ASA Brasil , José Nunes da Silva, presidente da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA); e Mercedes Torres, agrônoma e integrante da Associação de Trabalhadores do Campo da Nicarágua.
O diálogo entre ciências e a valorização do conhecimento camponês foi destacado durante todo o momento. Povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais, camponesas e camponeses produzem conhecimento, cultura e resistência. “Nós, agricultores e agricultoras, por muito tempo fomos invisibilizados no nosso papel, no papel de fazer a agroecologia, de construir a ciência da prática dos agricultores e agricultoras”, afirma Roselita Vitor. Para ela, boa parte do reconhecimento começa no Semiárido a partir das ações de Convivência com a região realizadas pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) desde o início dos anos 2000. Reconhecimento que, hoje, se estende para além da região.






“Sem os sujeitos que constroem na prática a agroecologia, ela não é integral. Ela não é forte. E eu acho que essa é a magia do papel dos agricultores e das agricultoras. Porque a gente traz o que nós aprendemos com os nossos pais na agricultura”, completa Roselita.
A importância dos diálogos entre saberes acadêmicos e populares também foi destaque na fala de José Nunes, da ABA. “A agroecologia é a ciência do encontro das ciências porque quando a gente fala em ciência, movimento e prática, parece que só tem ciência num lugar. Mas, a ciência está em todas essas dimensões, então, eu tenho me acostumado a pensar e tentar praticar o encontro das ciências”.
Cada gota de água é vida.
Dona Silvani emocionou a quem assistia o encontro ao narrar sua trajetória de retorno à terra natal e a transformação de seu quintal com o acesso à água e às políticas públicas de convivência com o Semiárido.
“As políticas públicas, a assistência técnica que a gente recebe, eu espero que chegue a milhões de brasileiros e nordestinos, principalmente, que é quem mais sofre nessa dureza de falta de água”, relatou a agricultora, que não desperdiça mais água. “Cada gota de água para mim é vida. Já não tem desperdício nenhum de água, que é para que eu possa ter o meu quintal, a minha fruta, a minha verdura, meu legume, tanto para eu comer como para alimentar meus animais.”
Não é só no Semiárido e no Brasil que as práticas de agroecologia unem povos e promovem soberania e justiça social. Mercedes Torres, da Nicarágua, trouxe uma perspectiva da agroecologia como estratégia integrativa.
“Estamos trabalhando em um corredor agroecológico mesoamericano que compreende toda a América Central e México e o que queremos com isso é compartilhar a experiência do corredor seco”, afirma.
As falas reafirmam o projeto político da agroecologia construído por organizações sociais e movimentos populares, percebendo a agroecologia como prática de enfrentamento às mudanças climáticas, afirmação e defesa dos territórios.

Terreiro de Inovações Camponesas e tecnologia social
O evento também marcou a abertura do Terreiro de Inovações Camponesas, espaço de encontro entre os conhecimentos acadêmicos, ancestrais e as tecnologias sociais desenvolvidas nas comunidades rurais. Proposto pela primeira vez em 2019, no 5º Encontro de Agricultores/as Experimentadores, realizado em Juazeiro do Norte (CE), é a terceira vez que acontece dentro do CBA. O espaço busca visibilizar as inovações que nascem nas comunidades, nos assentamentos, nos quintais, nas roças e que, muitas vezes, permanecem invisíveis às políticas públicas de inovação e dentro das instituições de pesquisa.
Para Gaston Kremer, diretor executivo da WTT Ventures, as experiências apresentadas no Terreiro “provam que a inovação não nasce apenas nos laboratórios, mas também nas cozinhas, nos quintais e nas casas de sementes, nas histórias das vozes, dos avós, dos ancestrais.
Os agricultores e as agricultoras trazem o que aprenderam com os pais, a fazer agricultura.
Encerrando o momento, Maria do Céu, agricultora e liderança sindical da Paraíba, conduziu uma ciranda coletiva que simbolizou o espírito do congresso: partilha, resistência e esperança. “Semeia, semeia, semeia… É semeando que a vida pulsa”, cantaram centenas de vozes unidas na Tenda Catingueira do CBA.

13º CBA
Nesta 13ª edição, em Juazeiro (BA), o CBA é realizado pela Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), com organização local da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), do Serviço de Assessoria a Organizações Populares (Sasop), da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), da Universidade do Estado da Bahia (Uneb de Juazeiro), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do Movimento dos Pequenos e Pequenas Agricultoras (MPA), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE) e Rede de Agroecologia Povos da Mata .
O Congresso conta patrocínio da Fundação Banco do Brasil e do BNDES e apoio do Governo Federal por meio dos Ministérios da Saúde, Igualdade Racial, Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, e Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e FioTec, e Prefeitura Municipal de Juazeiro; e Governo do Estado da Bahia, por meio do Programa Bahia sem Fome e Bahia Turismo.
Conta também com a contribuição de representantes de diversas organizações, redes e articulações da sociedade civil, instituições de ensino, movimentos sociais populares e comunidades tradicionais.