Por Cláudia Vasconcelos
BRASÍLIA – Quatro anos atrás, um grupo de sertanejas começava uma revolução em Afogados da Ingazeira, a 386 quilômetros do Recife. Desarticuladas, produtoras rurais e artesãs não ganhavam mais que R$ 50 por mês, dependendo economicamente dos maridos. De lá para cá, criaram uma rede de comercialização solidária que chegou a multiplicar a renda por seis e garantiu-lhes algo muito maior: a cidadania. Pela iniciativa, a ONG Casa da Mulher do Nordeste tornou-se uma das oito vencedoras do Prêmio Fundação do Banco do Brasil de Tecnologia Social 2009, entregue terça-feira.
Hoje, as 450 integrantes da rede organizam-se em 40 grupos produtivos, fabricando desde doces e sucos a peças de crochê e de decoração. Mantêm até loja em Triunfo, município turístico do Sertão. Para apoiar o negócio, criaram um fundo rotativo, que serve como banco que empresta sem juros. Com os R$ 50 mil do prêmio, os investimentos têm tudo para se expandir.
“Essas mulheres lutam incessantemente acreditando que é possível mudar este País. Sociedade e poder público têm que apostar em ideias assim. Mostramos que as mulheres têm, sim, direitos econômicos”, disse a coordenadora do Programa Mulher e Vida Rural da ONG, Marli Romão, que representou as companheiras na capital federal.
As participantes da Rede de Mulheres pela Comercialização Solidária aprenderam a superar burocracias para melhorar a produção. A cada seis meses, têm aulas sobre produção agroecológica, planejamento, acesso a crédito. Mas a capacitação vai além do aspecto econômico.
Antes do projeto, o índice de analfabetismo chegava a 37%. Depois, muitas animaram-se a voltar aos estudos. “O fato de se sentirem protagonistas da própria vida mudou a autoestima delas. Algumas se achavam incapazes por não saber ler, outras não percebiam o quanto a violência doméstica as afetava. Agora, estão fortalecidas”, comemorou a agente de geração de renda Francineide de Melo, que esteve na entrega do prêmio.
Com o reconhecimento, a tecnologia de Afogados da Ingazeira passa a integrar o banco de dados da Fundação Banco do Brasil (FBB). São 550 iniciativas cadastradas, que podem ser conhecidas em www.fundacaobancodobrasil.com.br. A intenção é atrair apoio para multiplicar as ações.
Este ano, a instituição certificou 114, nas áreas de educação, renda, meio ambiente, saúde, água, alimentação, habitação e energia. Segundo o gerente de tecnologias sociais da FBB, Jefferson de Oliveira, haverá recadastramento em 2010. “Assim, saberemos se as tecnologias ainda funcionam ou se sofreram adaptações.” O prêmio é concedido desde 2001, a cada dois anos, e precisa ser investido no projeto ganhador.