Dentro dessa lógica o Movimento solicitou a apresentação da pesquisa Sistemas Agrícolas Familiares Resilientes a Eventos Ambientais Extremos no Contexto do Semiárido, do Instituto Nacional do Semiárido (Insa/MCTI), em parceria com a Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA Brasil), (ASA/INSA), a fim de perceber como esta poderá contribuir com o desafio do campesinato.
A bolsista da pesquisa em Sergipe, Iva Melo, apresentou de modo geral os resultados e deu ênfase aos gráficos que analisam os resultados econômicos de dois agroecossistemas estudados no Semiárido sergipano. Um que possui o modelo de produção mais especializado e com um volume de terra de aproximadamente 176 hectares e outro com apenas 1,8 hectares e com uma produção altamente diversificada. As experiências estão localizadas respectivamente, nas comunidades de Poço Redondo e Porto da Folha.
Um dado interessante nessa pesquisa é a agregação de variáveis desconsiderada na lógica convencional dos cálculos econômicos. Ao analisar a renda monetária agrícola, ganhos e custos da produção foram considerados nessa análise: Produto Bruto, aqui definido como: PB = Autoconsumo + Trocas e Doações + Vendas + Estoque, Renda Bruta (RB) = Vendas + Trocas e Doações + Autoconsumo, Valor Agregado VA = RB – CI ( Consumo Intermediário, ou seja, custos da produção) e por fim , a Renda Agrícola, ou liquida do agroecossistemas, RA = VA – CI.
Quando comparados entre si, considerando a área total de cada um, temos o seguinte quadro:

No entanto, quando analisada a produção por hectare, a pesquisa revela o quanto a produção especializada é inviável ao campesinato. Enquanto a especialização produz uma renda liquida de apenas R$ 370,00 por ha o diversificado produz R$ 6.186,00.
A pesquisa ainda analisou o agroecossistema diversificado sem inovações tecnológicas e com inovações, como, cisternas, biodigestor, sistema PAIS, eco fogão, entre outras, conquistadas através de programas e políticas públicas.
Se antes das inovações o agroecossistema produziu um renda agrícola anual de R$ 6.078,00 com as inovações, tem um crescimento de quase 145%, atingindo a cifra de R$14.843,00.

Para a militância do Movimento dos Pequenos Agricultores de Sergipe, a pesquisa ganha bastante relevância, por mostrar de forma empírica o que o campesinato já sabe, mas, que tem extrema dificuldade de comprovar, visto que para legitimar o avanço do agronegócio há um vasto material produzido, pesquisado e compilado. Mas, em relação às práticas camponesas, segundo o Movimento, ainda há muitas lacunas na pesquisa cientifica, além de que revela explicitamente os modelos de produção em disputa no campo brasileiro, como destaca a militante Rafaela Alves, dirigente do MPA nacional.
“A pesquisa é fundamental, e é desse tipo de pesquisa que o campesinato e o Semiárido precisam para que os camponeses e camponesas consigam analisar e compreender aquilo que é viável e compatível com o projeto de sociedade que a gente defende. Nesse sentido a pesquisa nos revela os modelos de agricultura em disputa: a familiar e a camponesa e o que cada uma gera, seus processos econômicos, ambientais e políticos também. O campesinato precisa compreender melhor suas escolhas, pois quando se faz uma opção por um modelo em detrimento do outro é uma escolha política. O modelo de agroecossistemas especializados na pesquisa, pra nós é a tradução do conceito de agricultura familiar, tão difundido e defendido até por algumas organizações, ou seja, não é o agronegócio, mas também não é o campesinato”, salienta Rafaela.
Já para Thais Moura, estudante de geografia, na Universidade Federal de Sergipe e pesquisadora do agronegócio, a pesquisa ganha um caráter inovador ao abordar de forma empírica os ganhos da produção agroecológica. “Atualmente eu pesquiso a questão dos agrotóxicos no campo sergipano e como eles afetam a saúde dos trabalhadores e trabalhadoras rurais. E a pesquisa impressiona pelo fato de que normalmente não se tem essa dimensão de como a agroecologia dá resultados. Por que o que a gente vê na maioria das vezes é discurso. E a pesquisa mostra na prática que funciona e que deve ser difundida. E eu como estudante do agronegócio vi que há uma saída para esse modelo de produção. Então achei incrível a pesquisa e fiquei muito feliz de está aqui para assistir, pois abriu novas possibilidades de pesquisas para mim, nesse campo da agroecologia porque vi aqui de forma empírica como a agroecologia funciona”, diz.
Ana Paula, do coletivo de produção do MPA, destaca que a pesquisa ajuda a consolidar um trabalho que ela vem fazendo no sentido de mostrar a inviabilidade econômica da produção especializada do leite. Segundo ela, o estudo quer provar que os gastos com a produção de leite traz prejuízo ao produtor se não houver, na propriedade, outras estruturas de produção integradas. “Uma vaca gasta por semana R$ 60,00 só com ração comprada, sem considerar a palma e o rolão de milho que alguns camponeses e camponesas possuem. Para você tirar isso no leite precisa ser uma vaca muito boa de leite e fazer duas ordenhas diárias, e infelizmente a realidade da maioria é ficar mesmo no prejuízo”, afirma Ana Paula.
Para o MPA a pesquisa precisa agora chegar a todas as bases como forma de provocar de maneira radical a mudança do paradigma de produção e consolidar o plano camponês no estado. Para tanto, será construída uma agenda com a bolsista da pesquisa a fim de que mais camponeses e camponesas tomem conhecimento e se apropriem da pesquisa.