O agricultor José Sebastião da Silva, 42 anos, não teve dúvida. Quando soube que “uma ministra de Brasília” estaria em São Caetano, no Agreste, para tratar da construção de cisternas, decidiu que era hora de caminhar. Poucos dias após uma cirurgia, colocou-se na estrada de barro e percorreu os 10 quilômetros que separam sua casa, no Sítio Mingu, ao centro da cidade. “Uma cisterna dessas mudaria muita coisa”, confessou. A ministra era Tereza Campello, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Ela esteve ontem em São Caetano e assinou convênios com a Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA) para construção de 41.030 sistemas de captação e armazenamento d’água - cisternas, barragens, barreiros, tanques e bombas d’água.
A parceria, com meta de atender famílias de 253 municípios de nove estados, teve uma simbologia política. Foi firmada seis meses após o anúncio do MDS da suspensão do acordo com a ASA para construção de cisternas. Na ápoca, o caso teve repercussão nacional. Agora a parceria iniciada desde o primeiro governo Lula retomou força. As obras poderão fazer a diferença na rotina dos agricultores. José Sebastião sabe disso. Nas últimas semanas, ele e a mulher, Judite Mendes, 37, se revezam na beira da estrada para “pegar um balde d’água”.
Pernambuco receberá 17% dos equipamentos. Serão construídos no estado 6.963 sistemas de captação e armazenamento em 31 municípios do Agreste e do Sertão. A maior parte - 6.963 unidades - está incluída no programa Um Milhão de Cisternas, que ergue equipamentos com capacidade de 16 mil litros. As cerca de 600 mil cisternas existentes no semiárido nordestino, segundo o coordenador-executivo da ASA na Bahia, Naidison Baptista, estão fazendo a diferença. “São três milhões de pessoas que não precisam colocar o balde na estrada”.
A ministra sabe dessas contas. Sobre o assunto, ressaltou que o governo federal incluiu o acesso à água como um dos elementos do combate à miséria. “A miséria não é só resultado da falta de renda. É a falta de educação, saúde. E a falta d’água, talvez, seja o primeiro fenômeno da miséria”, disse.
Água modifica paisagem de sítio
A voz da agricultora Ivanilda Maria Torres, 45, ficou embargada quando ela estava em frente à ministra Tereza Campello. O discurso ensaiado durante noites sumiu da cabeça. “Então pensei no esforço e no sofrimento para chegar aqui”, contou. E a conversa fluiu. Ivanilda mora no Sítio Boqueirão, São Caitano, e foi a primeira agricultora do município a ter na propriedade uma cisterna construída pela parceria entre a ASA e governo federal, em 2003.
Oito anos depois, as mudanças podem ser vistas com facilidade. O reservatório fica a poucos metros de outro, com capacidade para 52 mil litros. Mas é o verde das árvores e a garantia de água para os próximos dois meses que a deixa aliviada.
Da segunda cisterna ela consegue o líquido para manter os bichos. Se um vizinho pede ajuda, Ivanilda não nega um balde d’água. “Essas cisternas são uma bênção na minha vida e na vida da minha família”, contou para a ministra, que almoçou no sítio. A bênção, acrescentou a agricultora, também está no fato de ter recebido capacitação para produzir frutas e verduras e ter despertado para outra relação com a natureza a partir de conceitos da agroecologia. Desde então, deixou de usar agrotóxico para produzir alimentos.
Preocupação
Em meio à felicidade de ser visitada por “uma ministra da presidente Dilma”, a agricultora deixou escapar a preocupação com a seca. “As coisas não estão boas. Se não chover nos próximos dois meses posso ficar sem água”. Desde que começou o inverno, São Caetano registrou menos de um 25% das chuvas que normalmente caem no município nesse período.