É simples assim: a família cava um buraco de pouco mais de um metro de profundidade e, com a ajuda de um pedreiro, usa placas de cimento para construir um abrigo seguro para a água da chuva, que atinge o destino esperado depois de cair no telhado da casa e escorrer por uma calha. Pelo trajeto curto e certeiro, ela pode atingir a marca dos 16 mil litros, suficientes para aplacar a sede ancestral do semiárido, bem conhecida do povo, das criações e das lavouras da região.

O buraco que engole a água da chuva para fazê-la minar na panela do nordestino, nas plantações e nos tanques dos animais é o primeiro passo do Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido: Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC), criado em 2003 pela Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA), integrante da RTS.

A iniciativa ganhou, junto com o espetáculo “Urucubaca”, da Trupe de Teatro do Grupo Cultural AfroReggae, do Rio de Janeiro, o Prêmio Anu Preto, lançado pela Central Única das Favelas (Cufa) para dar visibilidade às ações que contribuam para a evolução e revolução social de territórios à margem da sociedade.

As duas iniciativas foram indicadas por um grupo de colaboradores e, depois, escolhidas por voto popular. A festa da premiação, patrocinada pela Petrobras, foi no dia 7 de fevereiro, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

No semiárido, o Programa Um Milhão de Cisternas voltou-se contra a estiagem, a acomodação e o desequilíbrio das mais diversas naturezas para possibilitar que a água chegue até a boca do povo. Elaborado e executado pela ASA, o projeto vencedor foi gerido pelo Movimento de Organização Comunitária, da Bahia, na comunidade de Cajazeiras, no município de Conceição do Coité.

Uma vez garantido o uso do recurso apenas para beber, cozinhar e escovar os dentes, a família que ajudou a construir a cisterna - ao lado de pedreiros das próprias comunidades, capacitados pelo programa – vai ter água suficiente para ser usada durante o período da estiagem, que dura, em média, oito meses.

Ao possibilitar que as famílias tenham acesso a um recurso tão essencial para as atividades mais básicas do ser humano, aumenta-se também as chances de uma melhor condição de saúde. O programa tem como meta fazer com que 5 milhões de pessoas que vivem na região possam ter acesso à água potável para beber e cozinhar, armazenadas em cisternas.

O outro vencedor da noite, o espetáculo “Urucubaca” é uma reflexão sobre temas como o amor, o sexo e a violência. Baseada na Trilogia do Caos, de Jorge Mautner, a montagem de Johayne Hildefonso e Malu Cotrim leva para o palco seis músicos, que se expressam por meio da dança, jogos teatrais, músicas e máscaras.

A Trupe é um dos projetos do AfroReggae, fundado em 1993 para transformar a realidade dos jovens moradores de favelas, por meio da educação, da arte e da cultura. O grupo foi criado no mesmo ano da chacina de Vigário Geral, no Rio, que deixou 21 inocentes mortos. Um mês depois, o AfroReggae chegou à comunidade, oferecendo oficinas de percussão, reciclagem de lixo, dança afro e capoeira.