EnconASA
25.10.2016 CE
Fórum Cearense realiza Encontro Estadual em preparação para o IX ENCONASA

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Por Raquel Dantas e Manoel Leandro, da Rede de Comunicadoras e Comunicadores Populares do FCVSA

Encontro Estadual do Fórum Cearense pela Vida no Semiárido (FCVSA) | Foto: Neuzilane Oliveira

O último Encontro Estadual do Fórum Cearense pela Vida no Semiárido (FCVSA) aconteceu em Itapipoca e também no Trairi, na praia do Mundaú, entre os dias 19 e 21 de outubro. Além de promover a troca de experiências e conhecimentos entre as/os integrantes da Rede, fortalecer as estratégias de Convivência com o Semiárido e refletir sobre o cenário político, o momento teve como objetivo a preparação da delegação do Ceará para o IX Encontro Nacional da Articulação Semiárido Brasileiro (EnconASA). 

Com o mesmo tema do IX EnconASA - Povos e Territórios: resistindo e transformando o Semiárido, o Encontro Estadual possibilitou que toda a programação fosse voltada para a vivência e discussão em torno deste mote. No primeiro dia, após a acolhida das delegações e mística em Itapipoca, seguimos em grupos para cinco intercâmbios em pontos diferentes de Itapipoca e do Trairi. Já em Mundaú, para onde seguimos e demos continuidade ao encontro, um painel com o tema foi composto por Aurila Maria (quilombola da comunidade de Nazaré/Itapipoca), Adriana Tremembé (indígena da comunidade Tremembé da Barra do Rio Mundaú/Trairi) e Raimundo Paulo (assentamento Novo Jabuti/Granja).

Condições de exclusão, invisibilidade e negação de direitos entrelaça às suas histórias no território do Semiárido. Mas o elo mais forte está firmado na identidade de seus povos, comunidades e culturas e na resistência que são capazes de mobilizar e fazer ser motor de suas vidas. Aurila enfrenta o longo processo institucional de titulação de sua comunidade como quilombola e o preconceito que marca a socialização com pessoas de fora de Nazaré. Adriana resiste com o seu povo Tremembé a disputa do território indígena com o empreendimento turístico Nova Atlântida e com as ameaças de instalação de parques eólicos, além de ter que brigar com aqueles entre o próprio povo que não se identificam como indígenas e apoiam os projetos.

Raimundo, por sua vez, teve que encarar junto dos seus todo tipo de intimidação na briga pela terra e não abriu mão da defesa de seu território mesmo diante de ameaças a sua própria vida. Os retalhos dessas lutas vêm sendo costuradas com solidariedade, identificação mútua e da compreensão máxima de que estão do mesmo lado, que suas lutas são uma só. "Me sinto indígena, quilombola, me sinto da mesma família", diz Raimundo. Contam com quem se dispõe a se unir e constata que "é muito difícil estarmos sós numa luta", sempre contam com a força de companheiras e companheiros. Aurila lembra que desde o começo da mobilização de Nazaré buscam diálogo intenso com outros movimentos, e que entre quilombolas e indígenas sempre demarcam a presença e as reivindicações de luta uns dos outros aonde quer que vão. Adriana complementa: "Nossas lutas se unem".

Análise de conjuntura e debate sobre comunicação

Intercâmbio de experiências em Riachão | Foto: Raquel Dantas

A análise de conjuntura teve início com um cochicho entre grupos sobre o significado do momento político atual vivenciado no Brasil e para onde ele aponta. Destaques para a avaliação política institucional - com o próprio golpe articulado entre os poderes legislativo, executivo e judiciário, além dos grupos de comunicação, e a enxurrada de medidas do governo Temer em ataque aos direitos sociais (vide PEC 241 e proposta de Reforma da Previdência), e também para a autocrítica política como movimento social - ao imobilismo no qual a sociedade civil organizada se viu refém e à necessidade de agir de forma articulada e mais incisiva no embate por direitos.

Depois da apresentação das reflexões levantados pelos grupos, Carlinhos Ribeiro, da Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Ceará (Fetraece), e Cristina Nascimento, do Centro de Estudos do Trabalho e de Assessoria ao Trabalhador (Cetra) e do FCVSA, fizeram suas análises e provocações para a plenária. Carlinhos frisou que a história política é cíclica e que, como todo ciclo, esse não será superado ou modificado de um dia para o outro, e que nossa estratégia básica deve ser a unificação dos nossos projetos.

Para Cristina, precisamos estar nas ruas pela defesa de direitos. E afirma: "O Semiárido será o mais impactado com as perdas orquestradas pelo atual governo". Na abertura do debate para a plenária, Paulo César, da Cáritas Diocesana de Itapipoca, sugeriu que devemos revisitar nosso projeto político de sociedade através da convivência com o Semiárido, para que nossos gritos e palavras de ordem tenham eco, consistência e adesão pela população. Dona Ana do Assentamento 10 de Abril, Crato, diz que precisamos recuperar nossa motivação para as lutas. E, demonstrando a clareza de quem compreende que a luta social vai além de cada um, afirma que vai lutar pelos outros. 

Dentre os vários elementos levantados durante a análise de conjuntura, a comunicação foi ponto recorrente. Compreendendo o papel central que os grandes grupos de comunicação exerceram para a concretização do golpe político, muitas falas problematizaram o poder dos veículos e a necessidade da defesa da democratização da comunicação. Esta em especial para os povos do Semiárido, afetados diretamente com o cenário de oligopólio dos meios e da manipulação das coberturas sobre o território ou do debate raso que oferecem sobre assuntos de interesse dos povos que o habitam.

Entendendo que a comunicação popular é, portanto, uma das nossas principais estratégias na defesa da convivência, a Rede de Comunicadoras e Comunicadores Populares do FCVSA redigiu uma carta à rede estadual para dialogar sobre como manteremos os projetos que viabilizam a comunicação no fórum. O momento de apresentação da carta realizada no último dia do encontro foi seguida de debate. Algumas falas reforçaram que cada integrante do FCVSA deve compreender-se como comunicadora ou comunicador, que a disputa das narrativas cabe a todos, e que é preciso que o fórum se envolva tanto na apropriação dos materiais de comunicação, quanto no debate político sobre o direito à comunicação, para que a comunicação popular seja fortalecida. Algumas sugestões como analisar o rateio para contratação de comunicadores pelos fóruns microrregionais e a realização de outro encontro de comunicação envolvendo técnicas/os, agricultas/es e demais integrantes do Fórum para o próximo ano serão dialogadas por cada micro e pela nova coordenação do FCVSA.  

Eleições

O FCVSA passou por eleições no último dia do encontro estadual. A coordenação executiva foi recomposta em 50%, como proposição feita pela gestão atual, juntamente com membros da Coordenação Estadual, para que a recondução fosse de no mínimo metade, tendo em vista as mudanças no estatuto que serão discutidas ao longo do próximo ano. Desta forma, Marcos Jacinto (Elo Amigo), que compunha a coordenação estadual foi conduzido para a titularidade da CE, e Cristina Nascimento (Cetra), ex-titular, ficou na suplência da executiva. Essa gestão terá duração de apenas um ano. Nova eleição para a CE ao final do próximo ano deve ser realizada considerando o novo estatuto. 

Na votação da coordenação estadual, quatro novas organizações se colocaram para ocupar as cinco vagas existentes: ACB, Cáritas Regional, CDDH-Senador Pompeu e Espaf. Fetraece, Esplar e Obas pleitearam a continuidade. E IAC, que estava na suplência da CE, foi defendido para também compor a coordenação. A votação não chegou a ser feita por sugestão de Liliane Carvalho (MIM) de possibilitar que todas as organizações que se dispuseram pudessem compor a coordenação nesse momento.

Foi ponderado que 2017 será um ano em que o FCVSA precisará de reforços nessas instâncias, com a mudança de estatuto e com a conjuntura política, e que é importante colocar em prática a alternância das instituições nesses espaços de decisão, pelo equilíbrio e horizontalidade dos processos. Foi colocado ainda, por Cristina Nascimento (Cetra), que o Fórum precisará, em 2017, renovar as suas representações no Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) e na comissão do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). E que esses espaços são de grande importância para a articulação, sendo encaminhado que a escolha da direção do FCVSA e das representações nos dois espaços citados será amadurecido entre as oito instituições que se colocaram.