Crise
06.10.2017
A crise e a necessidade destruidora do capitalismo
Durante evento de comunicação, Neuri Rosseto traça uma linha do tempo sobre as consequências da crise dentro e fora do país

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Por Elka Macedo - ASACom

A crise mundial tem agravado as desigualdades sociais e contribuído para o aumento no número de miseráveis | Imagem ilustrativa internet

“A primeira exigência de todo militante político é tentar entender a realidade como ela é. Não é um exercício fácil e a gente tenta moldar ou mascarar a sociedade do modo como a gente queria que ela fosse ou de forma positiva ou de um pessimismo demasiado. O exercício é entender a realidade como ela é para então definir que passos dar. Acertar na análise é uma exigência para dar um passo político, mas acertar na análise não dá a certeza de que acertaremos na decisão política”. A provocação foi feita pelo Coordenador Nacional do Movimento dos Trabalhadores/as Sem Terra (MST), Neuri Rosseto, durante mesa de abertura do Encontro de Comunicação Popular do Nordeste.

Entender a conjuntura política, econômica e social tem sido um desafio constante dos movimentos sociais no Brasil nestes últimos dois anos. O cenário recente de mudanças estruturais na sociedade e, sobretudo, a ameaça e perda de direitos conquistados a duras penas pela classe trabalhadora estão entre os acontecimentos que têm despertado o fortalecimento das bases para impedir e até mesmo reverter esta situação. Neste sentido, o debate conjuntural durante o encontro, que reuniu cerca de 100 pessoas, ajudou a pensar estratégias de como a comunicação popular pode contribuir com esta luta. O evento aconteceu nos dias 28 e 29 de setembro, no Centro de Formação Paulo Freire,  município de Caruaru (PE).

Destarte, olhando para a realidade de forma holística e a nível internacional, Rosseto contribuiu para enxergar de onde partiu a crise, de que modo ela se institui na sociedade e quais seus principais impactos. “O que as crises mostram quando aparecem? Primeiro se rompe, de um modo geral, um certo pacto de classes que existe. Mesmo numa sociedade dividida em classes existem períodos de calmaria, é onde acontecem pactos da classe dominante com a classe dominada que permite uma certa normalidade para esta exploração capitalista. Nos períodos de crise a tendência é romper estes pactos e há uma tendência da classe dominante exceder mais o seu domínio. Ela tem que mostrar força. Nos períodos de calmaria isso passa de uma forma mais subliminar em que se mascara a dominação, já nos períodos de crise ela não hesita em mostrar sua força e violência para manter a hegemonia”, explica.

Ainda segundo o coordenador do MST, “no cenário nacional, se utilizam de golpes pra se manter como estar, já no cenário internacional se estabelecem guerras, ou seja, os períodos de crise deixam os conflitos de classe tornando-os mais explícitos. E os meios de comunicação exercem um papel importante nos dois momentos até para legitimar a violência que a burguesia exerce em períodos de crise. Torná-la naturalizada”. A afirmação leva-nos a uma viagem pela história, onde o poder e o capital imperam como grandes impulsionadores de conflitos, guerras e da disparidade econômica entre os mais ricos e os mais pobres no planeta.

Em também traçou elementos ou fatos que ratificam as crises mundiais e seus efeitos que inicia com a hegemonia do capital financeiro frente à economia e o declínio das potencias hegemônicas, como os Estados Unidos, que mesmo sendo ainda uma grande potencia militar já se mostra mais fragilizada frente ao contexto de perda de espaço no cenário mundial, sobretudo, pela formação dos Brics - agrupamento econômico composto por cinco países: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul que têm grandes potenciais econômicos para superar as grandes potências mundiais em um período de, no máximo, cinquenta anos. Esta disputa tende a provocar insegurança para a população, visto que há uma consequente geração de conflitos para ver quem assume a hegemonia.

Neuri Rosseto destacou a relação da crise no Brasil com o que tem acontecido em todo o mundo | Foto: internet

Além disso, segundo Rosseto, existe a ”necessidade destruidora do capitalismo. A necessidade da guerra e de sempre ter um inimigo comum da humanidade. Pós segunda guerra mundial a União Soviética cumpriu este papel, depois criaram a Al-Qaeda (o estado islâmico) e agora a Coréia. Sempre há a necessidade de ter este inimigo da humanidade. Essas duas questões que são o estado de guerra e o inimigo cumprem, pelo menos, três papéis fundamentais para o capitalismo: um é ativar a economia por meio da indústria bélica, o segundo é alimentar o medo da humanidade contra o inimigo posto no cenário, que justifica ou naturaliza governos que atuam para impor ou apaziguar; e o terceiro é que ajudam a pactuar hegemonias planetárias. Essa necessidade destruidora do capitalismo é o que a gente chama de quinto elemento dessa crise e que gera esta insegurança”.

Para além da insegurança, no Brasil a crise tem causado um considerável desmonte de políticas e ações voltadas à distribuição de renda e garantia de direitos da população mais carente, fator que pode colocar o país de volta ao mapa da fome. Nerci atribui esta ofensiva aos pobres à “hegemonia das políticas neoliberais que aumenta taxas de exploração, perda de direitos e das conquistas das classes trabalhadoras; estabelece o individualismo como alicerce, se contrapondo ao estado de bem-estar e de democracia de uma soberania nacional”.

Frente a todos estes impactos, há uma visível descrédito das instituições públicas e a população segue atônita às frequentes decisões que favorecem grandes empresários, latifundiários e multinacionais, em detrimento do júbilo da maior parte dos brasileiros. “O povo não se sente representado e as instituições [executivo, legislativo e judiciário] caíram no descrédito. Nenhum saiu isento. O capital está fazendo as reformas a toque de caixa, foi assim a reforma trabalhista e de todas as formas e o capital internacional está se apoderando das nossas riquezas naturais. Se não houver uma reação da sociedade não haverá solução da crise”, ressaltou Neuri, lembrando o quanto é urgente a unidade dos diversos movimentos sociais para combater o efeito nocivo e devastador da crise no país.