Agrobiodiversidade
25.04.2017
A urgência em cuidar dos biomas para garantir a vida

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Por Elka Macedo - Asacom

Governo Federal anuncia corte de 53% no orçamento do Ministério que cuida da preservação do meio ambiente

Um ano após o afastamento da presidenta eleita Dilma Roussef, a grande maioria da população agoniza com os inúmeros retrocessos em políticas e programas sociais e direitos trabalhistas. Além de tudo isso, acobertado pela grande mídia, o governo vem aprovando medidas que reduzem verba de instâncias públicas ligadas à preservação da natureza, a exemplo do Ministério do Meio Ambiente (MMA). No dia 30 de março deste ano, o governo reduziu 53% do orçamento previsto para o MMA e, com isso, a pasta que possuía R$ 964 milhões para custear as ações, passou a ter apenas R$ 446 milhões.

A medida afetará diretamente os compromissos firmados pelo Brasil em eventos internacionais que visam o desenvolvimento sustentável e a mitigação dos efeitos da desertificação e das mudanças climáticas, como a Rio +20, e a Conferência das Partes (COP), ligada à Organização das Nações Unidas (ONU). No artigo “O vexame de cortar pela metade a ínfima verba para o Meio Ambiente, elaborado pelos pesquisadores do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) Paulo Moutinho e Raissa Guerra, são enfatizados os danos que essa medida causará para os biomas brasileiros. “O corte orçamentário do MMA é mais do que um vexame para o país. Implicará num agravamento das já vexatórias taxas de destruição da Amazônia, do Cerrado, da Mata Atlântica, do Pantanal, da Caatinga, dos Pampas. É beber gulosamente o último gole de água num deserto, sem pensar no longo caminho que ainda precisa percorrer”, salientam.

Essa preocupação com o meio ambiente é antiga e envolve diversos segmentos da sociedade. Neste ano, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) trouxe à tona a reflexão e a denúncia da morte dos biomas brasileiros por meio do tema da Campanha da Fraternidade “Fraternidade: biomas brasileiros e a defesa da vida”. A ação ecumênica destaca a diversidade de cada bioma e as relações respeitosas com a vida e a cultura de todos os povos que neles habitam. Sobre a Campanha, o Papa Francisco comentou por meio de mensagem enviada à Igreja Católica do Brasil o quão importante é esta ação. “Não podemos deixar de considerar os efeitos da degradação ambiental, do modelo atual de desenvolvimento e da cultura do descarte sobre a vida das pessoas”.

O pontífice declarou ainda que “os povos originários de cada bioma ou que tradicionalmente neles vivem nos oferecem um exemplo claro de como a convivência com a criação pode ser respeitosa, portadora de plenitude e misericordiosa. Por isso, é necessário conhecer e aprender com esses povos e suas relações com a natureza. Assim, será possível encontrar um modelo de sustentabilidade que possa ser uma alternativa ao afã desenfreado pelo lucro que exaure os recursos naturais e agride a dignidade dos pobres”. 

Queimada no Cerrado para expansão do Matopiba

Ameaça aos biomas e povos do Semiárido

No Semiárido brasileiro há uma grande predominância dos biomas Caatinga e Cerrado, e são deles que provém a manutenção da vida dos povos que habitam a região. No entanto, eles estão entre os biomas brasileiros mais ameaçados pelo desmatamento e são suas vegetações que impactam diretamente no curso das águas que abastecem o Semiárido. O Cerrado é conhecido como berço das águas, pois é de lá que brotam os aquíferos e as nascentes dos principais rios que fornecem água para a região. Já a Caatinga fornece o alimento e gera renda, permitindo que milhares de famílias agricultoras permaneçam no campo com dignidade.

Dados oficiais do Governo Federal confirmam que 45 % das árvores do Cerrado e 49% das árvores de Caatinga que formavam a cobertura vegetal original de sua bacia já foram derrubadas. Isso implica no enfraquecimento do solo, perda das águas, extinção de plantas e animais nativos e impacta diretamente na vida dos povos que habitam a região.

“A gente não deve desmatar porque a gente tem comentado muito que esses anos de seca veio pra ensinar os agricultores, porque quem tinha áreas abertas e desmatou pra plantar capim e não teve dinheiro pra comprar ração não conseguiu criar os animais que morreram de fome. Já quem tem uma área de mata preservada, conseguiu fazer escapar o rebanho com menos despesa. Ai a pessoa tem que parar pra pensar!”, explica o agricultor experimentador Francisco Gomes, mais conhecido como Chico Peba, que mora na comunidade do Pote, no município pernambucano de Santa Cruz.

O professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Genivaldo Barros, salienta que a constante degradação dos biomas compromete a vida das famílias que habitam a região Semiárida. “A perda da capacidade de “produzir água” e a deterioração/degradação dos solos enfraquece as cadeias produtivas da agropecuária, empobrecendo as pessoas e o Estado, aumentando o “estado de miséria” e ameaçando a segurança alimentar das famílias. No Semiárido de solos rasos, pedregosos e com baixa capacidade de armazenar água, as ações de degradação têm levado ao surgimento cada vez maior de riachos “secos”, tornando ainda mais escassa a água em quantidade e qualidade para a população”, ratifica Genivaldo Barros.

Além da retirada da madeira para uso como matriz energética e o desmatamento para criação extensiva de gado e para produção em grandes áreas irrigadas, os biomas Caatinga e Cerrado e as populações que neles habitam têm enfrentado os efeitos de grandes obras como a Transnordestina, a Transposição do Rio São Francisco e o Matopiba. Para a construção dessas três grandes obras, famílias estão sendo desapropriadas, reservas estão sendo devastadas e a água de aquíferos e nascentes tem sido canalizada.

Para o professor, todos os empreendimentos prometem melhorar a vida da população, mas até o momento têm alimentado a estratificação social e favorecido grandes empresários e latifundiários. “Obras como a Transnordestina, a Transposição do Rio São Francisco e a expansão das fronteiras agrícolas nos extremos dos Estados que compõem o Matopiba trazem junto um legado de destruição cujo impacto na vida dos mais pobres nestas regiões são e serão sempre acachapados pelos interesses do mercado de capital e que ainda imperam sobre a decisão dos seres que aqui vivem, governam e que ainda são adeptos da máxima de que: o que vale é aquilo que proporciona lucro, independente do custo que isto trará para o futuro da vida, não só das pessoas, mas de toda a biodiversidade local”, conclui.