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09.03.2017
A força da greve de mulheres pelo mundo
Site - Tpm
Do sertão de Pernambuco a Varsóvia, multidões saíram às ruas mobilizadas por diretos e fim da violência de gênero

Por Luciana Taddeo

“Por que estamos caminhando separadas se seria melhor nos juntar?”, perguntou-se em outubro do ano passado a escritora polonesa Klementyna Suchanow ao saber que o movimento argentino Ni Una Menos convocara uma greve contra mais um brutal feminicídio no país. Semanas antes, as polonesas tinham realizado uma paralisação que conseguiu frear a total proibição do aborto.

A iniciativa do Ni Una Menos ganhou repercussão internacional, e atos em solidariedade foram realizados em países da América Latina. Manifestantes de diferentes nacionalidades começaram a trocar experiências e identificar bandeiras comuns, como luta contra desigualdades econômicas, descriminalização do aborto e fim da violência de gênero.

Esse foi o início de um diálogo que resultou em um Dia Internacional da Mulher histórico em 2017. Em diversos idiomas e latitudes, mulheres de 57 países realizaram ontem uma greve internacional de mulheres. Multidões saíram às ruas e quem pôde paralisou atividades produtivas ou domésticas para tornar visível a importância das múltiplas jornadas de trabalho enfrentadas por nós.

Somente no Brasil, a greve – também chamada de Parada Brasileira de Mulheres – contou com adesão de mais de 80 cidades e 24 capitais. Marchas, piquetes, uso da cor lilás, “apitaço” e conversas com companheiras no local de trabalho sobre desigualdades eram outras formas de apoio.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, o Brasil é o quinto país com maior taxa de homicídios de mulheres. Para Tati Magalhães, uma das organizadoras da greve em Brasília pelo Coletivo Rosas pela Democracia, políticas públicas efetivas para impedir o aumento da mortalidade de mulheres, em sua maioria negras, são pauta urgente. As manifestantes também repudiaram a reforma da previdência e exigiram o fim do racismo.

Em Araripe, no Sertão de Pernambuco, a parada contou com a participação de mais de 800 mulheres que protestaram contra a reforma da previdência social Foto: Vera Guedes

Além das motivações conjuntas, os protestos retrataram a diversidade do Brasil, com reivindicações de mulheres indígenas e quilombolas no Norte por território e a questão das hidroelétricas que afetam comunidades indígenas e ribeirinhas em localidades como Altamira. É o que conta Analba Brazão Teixeira, militante da Articulação de Mulheres Brasileiras: “Cada estado, cada cidade traz o que está apertando mais no seu sapato”, diz.

Segundo ela, eventos dos últimos anos, como a Marcha de Mulheres Negras, já vinham “criando caldo” para a articulação de movimentos das diferentes capitais e cidades do interior. Em locais como o Sertão do Araripe, em Pernambuco, por exemplo, houve paralisação. Uma das presentes conta que cerca de 800 mulheres fecharam a BR que liga o estado ao Piauí, ateando fogo em pneus e fazendo "apitaço". "A gente está num país onde a cada 11 minutos uma mulher está sendo estuprada. O aborto clandestino é a 5ª causa de morte materna entre as brasileiras. E quem são elas? As mulheres negras e as mulheres pobres. As negras são a maior parte das vítimas de feminicídio, são as maiores vítimas da violência sexual e da violência física. A cada 23 minutos um jovem negro é morto, e esse jovem negro é filho de uma mulher negra, então aí a gente vê como está essa questão do racismo", diz Analba.

Para a cineasta Marina Fuser, uma das organizadoras da marcha que saiu da Avenida Paulista e se unificou com um ato realizado na Praça da Sé, em São Paulo, o Brasil vive uma “primavera feminista” entre as mais jovens. “As meninas novas querem falar sobre isso. Antes o feminismo era visto como uma coisa estranha, muitas rejeitavam esse nome. Hoje está num programa da Globo, em festivais de cinema, não tem como não discutir sobre”, acredita.

Mariana Bastos, administradora da página 8M Brasil, e uma das articuladoras da greve internacional, ressalta a diversidade dos países participantes. Segundo ela, as suecas, por exemplo, que já contam com diversos direitos, disseram que marchariam em solidariedade aos demais países, e que na Tailândia, onde greve ou marcha podem acarretar em prisão, mulheres optaram por usar uma pulseira vermelha como protesto.

Nos EUA, houve críticas a Donald Trump. “O ódio dele às mulheres é tão explícito que você pode dar um rosto para o problema e isso ajuda a unificar as ações das mulheres”, explica Sarah Leonard, organizadora da greve em Nova York.

Na Argentina, as manifestantes entrevistadas pela Tpm se mostraram orgulhosas por serem uma das inspirações da greve internacional de ontem. Já na Polônia, o protesto desta quarta foi ainda maior do que no ano passado nas grandes cidades, diz Suchanow, que embora considere a greve internacional histórica, diz esperar um impacto mínimo sobre governos. “Temos que fortalecer laços e continuar lutando. É um longo caminho. Acho que no fim vamos ganhar, mas não sei em quantos anos”, conclui.

Para Mariana, da 8M Brasil, o que aconteceu ontem é só a ponta do iceberg de um movimento muito mais interessante: a construção de alianças muito potentes ao redor do mundo. “As mulheres estão se fortalecendo. A gente está trabalhando em conjunção internacional para tentar deter um avanço conservador internacional, regional e local.”

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