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21.12.2016
Tecnologias sociais são usadas por camponeses para superar a seca no semiárido nordestino
Site - R7
Convivendo com a maior seca dos últimos anos, sertanistas buscam soluções criativas

Por Juca Guimarães

O sertanejo continua, acima de tudo, sendo um forte. As dificuldades enfrentadas para sobreviver em um dos biomas mais inóspitos do planeta são enormes, porém, também é grande a variedade de alternativas que os agricultores desenvolveram para garantir uma sobrevivência digna na caatinga.

Atualmente, a luta por uma relação sustentável e equilibrada com o meio ambiente nos dez estados brasileiros dentro da área da caatinga conta com o compartilhamento de tecnologias sociais, ONGs, associações de agricultores e instituições como a Fundação Banco do Brasil, que nos últimos dez anos investiu R$ 2,4 bilhões em mais de seis mil projetos que beneficiaram aproximadamente 3,3 milhões de pessoas na região.

"O nosso trabalho contribui para a união de esforços entre vários setores da sociedade para que transformações aconteçam. Destacando sempre o protagonismo das comunidades locais, a mobilização social e a integração do conhecimento popular com o conhecimento científico", diz Asclepius Ramatiz, presidente da Fundação Banco do Brasil.

As tecnologia sociais são inovações produtivas que possam ser reaplicadas (e compartilhadas) desenvolvidadas e organizadas de forma coletiva para soluções de problemas relacionados a diversas áreas (alimentação, recursos hídricos, educação, renda, meio ambiente, entre outros).

Boa parte do trabalho da Fundação Banco do Brasil no auxílio de desenvolvimento das comunidades do semiárido está reunido na base de dados do aplicativo BTS (Banco de Tecnologias Sociais), gratuito para as plataformas iOS e Android. O aplicativo funciona como um grande reservatório de ideias que comprovadamente deram certo e que foram desenvolvidas por instituições de todo o pais especializadas em transformação social. No aplicativo, é possível encontrar um passo-a-passo das tecnologias sociais para que sejam reaplicadas. Atualmente, são mais de 850 tecnologias com eficácia certificada pela Fundação Banco do Brasil e prontas para serem compartilhada.

Outra organização que auxilia na propagação de técnicas para a melhoria da vida na região da caatinga é a ASA (Articulação Semiárido Brasileiro), rede que reúne cerca de três mil entidades, como Ongs, sindicatos rurais, associações de agricultores, pesquisadores e cooperativas, Oscips (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), entre outros.

Na prática - O agricultor Delfino da Silva Oliveira, de 23 anos, é um dos milhares de sertanistas que decidiram não abandonar a caatinga e buscaram uma maneira de conviver com as limitações impostas pelo bioma. Com o auxílio de tecnologias socias, práticas de empreendedorismo e economia solidária, a família Oliveira transformou a própria realidade.

A propriedade de Delfino tem cerca de 2,5 hectares onde se planta uma grande variedade de hortaliças, grãos, verduras, legumes e algumas frutas, na cidade de Esperança, na Serra do Borborema, no interior da Paraíba. Mesmo com o espaço pequeno, se comparado aos latifúndios da região, eles conseguem manter uma criação de vacas, galinhas, porcos, ovelhas, perus e abelhas.

Com orientação da AS-PTA, organização não-governamental para promoção do desenvolvimento rural, que existe desde 1983 na região, Delfino conseguiu aplicar diversas tecnologias de baixo custo na propriedade que ajudam na produção e no cotiano da família formada por seis pessoas. Com o dinheiro ganho na venda do excedente da produção, o jovem agricultor comprou um carro e equipamentos para ajudar na plantação.

A propriedade tem duas cisternas, para 68 mil litros, e uma caixa reservatória para mais 1.000 litros. Essa água, recolhida nos meses de chuva, é usada para a irrigação da lavoura, cuidado dos animais e uso doméstico.

No ano passado, Delfino instalou na propriedade um biodigestor ecológico, que transforma estrume e material orgânico em gás de cozinha. Com o biodigestor, a família reduziu em 85% a despesa com gás de cozinha.

"Aos poucos a vida na roça vai ficando melhor. A cada novidade é um avanço muito grande pra gente que precisa viver da terra. Antes todos os meus amigos depois que pegavam uma certa idade iam para a cidade atrás de emprego e deixavam tudo para trás. Hoje, eu e muita gente já pensa que é melhor ficar. Imagina ter que ir para um cidade grande e ficar em um emprego que paga mal e ainda levar bronca do patrão. Eu não seria feliz vivendo assim", diz Delfino, que já faz planos de casar com a noiva Denise e investir ainda mais na propriedade da família.

Delfino vende os seus produtos na Feira Agroecológica de Esperança e é lá também que ele conversa com outros camponeses sobre a aplicação de tecnologias sociais. "Aqui em casa as pessoas viam com desconfiança no começo, mas depois viram que dava para melhorar de vida", diz.

A seca ainda aflige a vida dos moradores do sítio de Delfino, este ano por exemplo, a produção de flores ornamentais da dona Lia, mãe de Delfino, ficou abaixo do esperado por conta da falta de chuva, porém, nada comparado ao passado que era marcado pela fome e exôdo dos jovens para os grandes centros.

No sítio do Delfino, a captação de água quando chove é feita de duas maneiras. Uma cisterna recebe a água que cai no telhado da casa. A outra usa o método do calçadão, onde uma área pavimentada de aproximadamente 30 m² capta a água que, após passar por um filtro, vai para um reservatório. Com uma bomba, eles usam essa água na irrigação da plantação.

O sistema é eficaz para amenizar os efeitos da falta de chuva na região. De acordo com o engenheiro agrônomo Emanuel Dias, a Serra do Borborema, passa por uma das piores secas dos últimos anos.

Bodes e sementes - A Fundação do Banco do Brasil também apoia as iniciativas solidárias de desenvolvimento social na caatinga da Serra do Borborema, no interior da Paraíba. Um dos projetos é Sementes da Paixão, banco de sementes que oferece dezenas de opções de sementes de boa qualidade para serem plantadas "no rastro da chuva". São matrizes de ótima qualidade que proporcionam uma colheita boa sem a necessidade de agrotóxicos.

O banco de sementes é estruturado em forma de rede e as famílias beneficiadas em um ano contribuem com sementes para que outras famílias sejam ajudadas no ano seguinte. Na Paraíba, a rede atende mais de cinco mil famílias com mais de 200 variedades de milho, feijão, arroz, guandu, fava jerimum, entre outras sementes. Em 2014, o Sementes da Paixão tinha 230 subgrupos de colaboradores com capacidade para armazenar 300 toneladas de sementes de excelente qualidade produzindo alimentos sem transgênicos para subsistência e geração de renda.

Nos municípios de Queimadas e Remigio, no agreste paraibano, a Fundação Banco do Brasil apoia o projeto "Guardiãs e Guardiões das Raças Nativas" que doa cabras e bodes para adolescentes começarem uma criação e uma fonte de renda pessoal. Não existe custo para o jovem. A contrapartida é a devolução para o programa da primeira cria fêmea, que será doada para um outro adolescente, numa espécie de fundo rotativo solidário. Cada animal criado livre pode chegar a 30 quilos, gerando até R$ 600 de lucro com a comercialização da carne. O custo de manutenção dos bodes é muito baixo e os jovens podem cuidar da própria criação enquanto ajudam os pais nas atividades rurais.

Duas vezes por mês, os jovens e adolescentes do programa se reunem com um coordenador para participar de rodas de bate-papo sobre economia solidária e cidadania. "É um jeito de conscientizar o jovem sobre a importância de continuar no campo e aprender a ganhar o próprio dinheiro. Alguns garotos já têm rebanhos com seis animais", disse Edilânia, coordenadora de um dos grupos. Além de participar das reuniões, os jovens do programa devem comprovar que estão estudando. A idade mínima para se inscrever é nove anos.

Rendeira do Facebook - A internet e as redes sociais também são ferramentas poderosas para garantir a permanência do sertanejo na caatinga. Pela internet é possível otimizar os negócios de pequenos artesãos. Despachando as encomendas pelos Correios, é possível fazer negócios com todo os cantos do país.

"Tenho uma página no Facebook onde faço contato com os clientes e divulgo o meu trabalho", disse a artesão Marlene Leopoldino. Ela mora na cidade de Monteiro, no sertão da Paraíba, fez um curso de gestão de negócios no Sebrae.

Outra vantagem da venda pela internet é a eliminação da figura do intermediário. "As gerações de rendeiras que vieram antes de mim tinham um lucro muito pequeno, quase nadinha. O povo vinha aqui comprava barato e revendia caro na capital. A gente mesmo nem via o cheiro do dinheiro", afirma Marlene. Confira aqui o perfil e os trabalhos da artesã.

Em São Paulo - A importância da valorização dos pequenos produtores que, por sua vez, têm uma relação diferenciada com a região em que vivem e os meios de produção, ganhou bastante destaque nos últimos anos. Os consumidores estão mais interessados e engajados com a origem e história dos alimentos.

"No meu processo evolutivo, percebi que o fundamento daquela relação começava com o ingrediente e que não dava para entender o ingrediente sem entender o seu entorno, a natureza. Sem esquecer que a natureza tem entre seus componentes um elemento que muitas vezes é deixado de lado: o Homem", diz o chef de cozinha Alex Atala, co-fundador do instituto ATÁ, que apoio projetos ligados a biodiversidade, agroecologia e sociodiversidade, como os desenvolvidos na Serra do Borborema, no interior da Paraíba.

Na cidade de São Paulo, os produtos das redes de projetos ecologócios como o Central do Cerrado (GO e DF), Ecovida (RS), IRPA (BA), Rede Terra (GO), Poloprobio (PA), com uma grande variedade de sabores exóticos da sociodiversidade brasileira são vendidos em quiosques especializados no Mercado de Pinheiros, na zona Oeste.

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